segunda-feira, 14 de abril de 2008

Plástica

"Pra mim era como se ele estivesse perguntando se eu queria morrer de tiro, afogada ou enforcada. Não sei o que escolher."


Foi assim que a Fabíola saiu do consultório em sua primeira consulta com o cirurgião plástico que faria a reconstrução da sua mama logo depois da mastectomia. Dessa vez eu fui junto.


Passamos três horas nos consultórios dos dois médicos: primeiro o cirurgião plástico, depois o mastologista/oncologista. O dr. Márcio Costa, cirurgião plástico, explicou para a Fá quais as opções de cirurgia reconstrutora da mama e as vantagens e desvantagens de cada uma. As duas primeiras envolviam uma prótese de silicone, que tem de ser trocada a cada 10 anos em média. A terceira consistia em retirar tecido adiposo do abdome e fazer uma falsa mama com a gordura do próprio corpo da Fá. A desvantagem estava na recuperação mais lenta e numa cicatriz que ficaria de ponta a ponta do abdome. Mas a grande vantagem, segundo ela, era se livrar da barriga -- sonho que ela tinha praticamente desde tempos intra-uterinos. Assim mesmo ela não sabia o que escolher. Diante da ansiedade, a palavra de sabedoria veio da minha mãe: "Deixa que as coisas vão se decidir por si sós."


E assim foi. Entrando no consultório do mastologista descobrimos que o tumor era maligno, sim, com grau II de malignidade e de invasão. Havia pegado um pouco do músculo peitoral, que teria de ser retirado. Com isso a única opção de reconstrução que sobrava era a última, sem chance para o silicone. O reto-abdominal da Fá também teria que ser "transportado" para o lugar do peitoral e o abdome dela ficaria protegido por uma tela.


Também fomos avisados de que, após a cirurgia, a Fabíola teria que passar por uma quimioterapia pesada. É o que se faz com pacientes muito jovens por dois motivos: primeiro, para diminuir ao máximo a chance de recidiva. Segundo, porque o organismo jovem reage bem ao bombardeio da químio.


A notícia caiu muito mal para a Fá. Ela ficou péssima ao saber que teria que enfrentar uma químio que a faria perder os cabelos. Pra mim foi uma surpresa: eu, por minha vez, estava de luto pela mama perdida da Fá e lamentava a cicatriz que ela teria de carregar para o resto da vida. Mas pra ela o que pegou mais foi a notícia da queda dos cabelos. O baque durou até o dia seguinte. Ela ficou super murchinha. Se perguntassem a ela como ela estava conseguindo passar por aquilo tudo ela diria o que me disse ao sair do consultório: "Eu não estou passando, estou sendo passada!" Mesmo com todo o desânimo, porém, ela não reclamou. Nem se questionou. Tinha que passar (ou "ser passada") por aquilo e ponto final. Para alguma coisa na vida dela isso serviria e não cabia a ela perguntar por quê, mas fazer do limão uma limonada.

Confesso que nem eu mesma sabia o quanto minha irmã era forte e madura. Sabia até um certo ponto, mas não imaginava que o grau de maturidade espiritual dela fosse tão alto. Não sei se eu não teria me revoltado. Provavelmente teria, pra ser sincera.

No entanto nem tudo foram más notícias: as chances de cura eram bem altas. Os dois médicos eram fenomenais. Haveria também a chance de ela não passar pelo que comumente se chama "esvaziamento axilar".

Há pouco mais de uma década, toda pessoa que tinha câncer de mama tinha que tirar os linfonodos (que são responsáveis pela "limpeza" do corpo) da axila. Isso porque a axila é normalmente o primeiro local do corpo a sofrer com metástase e depois pode enviar as células cancerosas para outros lugares. Mas há algum tempo foi desenvolvido um teste para o chamado linfonodo sentinela, que é o que primeiro que manifesta a metástase. Se o teste da Fabíola desse negativo antes da mastectomia ela não precisaria se submeter ao esvaziamento axilar em 95% dos casos. Em apenas 5% a metástase se manifesta um pouco mais tarde, depois de uma análise mais aprofundada do material em laboratório. Aí o esvaziamento axilar é feito dias ou semanas depois.

No fim saímos do consultório com a cirurgia marcada e toda a documentação pronta para ser enviada ao convênio. E isso são cenas de um próximo post.

Um comentário:

Unknown disse...

Oi Cris,
estou aqui, tendo que trabalhar pois preciso terminar um relatório. Mas, acabei "parando" nos seus dois "blogs". Sua descrição da situação por que Fabiola, voce, Ávila, sua mãe e Alin (o marido da sua mãe?) passaram não foi "moleza". Bom, não que um CA seja, qualquer "que seja". Mas, sua descrição me "fez estar lá, 3 anos atrás". Incrivel. Imagino como o "velinho", com os seus 77 mil km, ficou com o seu coração apertado. Estou/estamos passando por um CA na família (minha irmã mais velha). Mas, este não pode ser operado e apenas "administrado". A situação é grave e "doi muito" no meu coração.
Mudando de assunto, e o Alin, esta tudo em ordem com ele?,
bjs,
John.