terça-feira, 25 de março de 2008

Diagnósticos - parte II

Voltei na semana passada de uma viagem de trabalho de 10 dias, três dos quais passados no meio da floresta amazônica. Apesar de não querer estar longe de casa neste período a ausência me fez bem. Por pouco tempo pareceu que as histórias deste blog ficaram a uma distância de várias eras. Na verdade tanta coisa aconteceu nos últimos dois meses que, mesmo que eu ficasse em SP, já dava para ter a impressão de que algumas eras se passaram. No entanto é fácil lembrar do último 21 de janeiro, tal o impacto que teve na vida da família.

Foi uma segunda-feira, exatamente uma semana depois de a Fá ter completado 35 anos. O meu celular tocou pouco antes das 18h00 e eu não consegui atender a tempo. Liguei pra ela de volta mas ela não atendeu. Deliguei o telefone para participar da missa. Lá, por graça de Deus, encontrei meu "eu" masculino: meu amigo-irmão Alex. Ele veio caminhando comigo da igreja até minha casa, enquanto eu via no celular que havia várias ligações não atendidas da Fá. Liguei pra ela de volta. Não atendeu. Até que ela ligou com a voz um pouco turvada: "Cris, estou saindo do consultório do dr. Alexandre. É, parece que o nódulo não é coisa simples." Não vi como ficou minha cara nesse momento, mas o Alex disse que pela primeira vez desde que nos conhecemos ele me viu realmente preocupada.

A Fá chegou em casa com olhos vermelhos. O próprio dr. Alexandre havia levado um susto ao ver o resultado da mamografia. O nódulo havia dobrado de tamanho em três meses.

O dr. Alexandre é do tipo que pra morrer de repente leva três meses. É de uma calma invejável. Nunca nos alarmou com nada. Dessa vez, apesar dos pesares, não foi diferente, mas as notícias em si eram alarmantes. Segundo a Fá, a ficha dela caiu logo que ele viu o resultado da mamografia e começou a fala dele com a seguinte frase: "Fabíola, eu vou ser sincero com você." Já dava pra sentir o que estava por vir. Ele não havia gostado do resultado da mamografia. O comportamento do nódulo estava muito suspeito. A Fá perdeu o chão. Ele foi descrevendo o histórico dos exames dela, mas ela já não ouvia direito. Começou a chorar. No total eles ficaram quase uma hora no consultório e ele a encaminhou para um mastologista e oncologista da confiança dele. Mais tarde ele me disse que é complicado recomendar colegas por causa da expectativa que isso gera, mas que o especialista que ele havia recomendado era o mastologista da família dele. Diz ele que é suspeito para falar do colega e que não tem o menor problema em dizer que, nessa área em particular, o colega é melhor do que ele. (Semanas depois eu descobri que o próprio dr. Alexandre foi considerado um dos melhores ginecologistas do Brasil por uma pesquisa feita entre médicos. E ele atende convênio! É um fofo. Quem diz que humildade não leva a nada?)

A Fá saiu do consultório soluçando de tanto chorar e tentou me ligar várias vezes. Como caía na caixa postal ela resolveu ligar para o namorado, o Fernando. Esta figura é um caso à parte. O Fê cuida sozinho da mãe que tem Alzheimer e leva uma vida pra lá de estressante, mas é das pessoas mais alegres e bem-humoradas que eu conheço. Não é difícil imaginar por quê a Fabíola não queria deixá-lo preocupado, mas ela tinha que falar com alguém.

Como se não bastasse ser bem-humorado o Fernando também é muito sensato. Ele acalmou a Fabíola e disse que, antes de se preocupar, ela devia esperar pela consulta com o mastologista e fazer mais exames para ter o diagnóstico correto.

Já eu, apesar de estar razoavelmente serena, sentia que os exames só confirmariam a minha suspeita: nódulo maligno. Subi ao meu apartamento rezando uma Ave-Maria e logo depois cantando "Nada Te Perturbe", canto de Taizé baseado em uma oração de Teresa de Ávila, tentando me controlar. Minha casa não parecia minha, o tempo estava meio congelado. E por falar em Ávila, logo encontrei meu pai e tentei cumprimentá-lo de um jeito normal.

A Fá chegou em casa com os olhos vermelhos. Nós duas nos trancamos no quarto e ela foi me contando o que havia acontecido. Apesar do nervoso ela estava em pleno controle de si mesma e disse estar pronta para aceitar o que viesse sem se perguntar por quê.

E como é que faríamos com os pais? Não ia ter jeito, tínhamos que contar pra eles. Não somos boas mentirosas. Melhor que eles soubessem da suspeita e depois ficassem aliviados se fosse o caso. Chamamos meu pai para conversar. Ele ficou meio paralisado, mas não surtou. O mesmo aconteceu no telefonema para minha mãe.

A noite foi difícil pra mim. A Fá, porém, dormiu bem. Eu só consegui dormir depois de ter entrado nos e-grupos dos amigos da Igreja pra pedir orações. Sabia que só isso ia me sustentar dali pra frente.

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